ZONA - Estreia

ZONA
1 de Agosto de 1999
MEMÓRIA DESCRITIVA
Festival de Teatro de Montemor-o –Velho


sinopse 1
Os vários objectos que estamos a produzir completam-se entre si em círculos sendo que o seu somatório é menor do que aquilo que representam para a Zona. Todos eles têm a sua génese nesta ideia de territórios/zonas. A ideia de procurar como o trocadilho do título prenuncia na forma das coisas a forma das forças. Cada objecto criado transporta em si um pouco da dimensão que esta ideia despoletou em nós. Sem que a nossa primeira intenção fosse claramente essa começámos a desenvolver uma série de conceitos que giram à volta da ideia de desterritorialização do acto de teatro. O vídeo é um meio que tem representado para o grupo um acessório de trabalho. Contudo esse acessório sempre revelou um certo desconforto de relacionamento com as outras tecnologias normalmente por nós empregues. com um sentido crescente de que pode Criar um mundo. Um mundo onde os homens comem pedras e as mulheres têm bebés de pão, onde a luz aparece de só de vez em quando. Aonde o exterior se confunde com o exterior e com o interior também. Um mundo uma zona de onde os homens saem de bolsos cheios de coisas enfiadas dentro de sacos de plástico, cheios com ainda mais coisas de tal maneira que os homens já não os conseguem voltar a enfiar dentro dos bolsos. Um mundo em que o tempo é um lugar comum uma espiral onde cabe o espaço todo ao mesmo tempo. Um mundo sonhado por gajos pequeninos. Um mundo inteiro igual a este só que está avariado. E as estórias de testemunhas que esforçam-se por explicar aos outros aquilo que vêm e que os levam a passear pelas ruínas e que no final lhes cobram dinheiro como os guias fazem aos turistas. Uma estória de amor. Dita de uma forma natural e crua prolongando a dor até o dia nascer.ZoNA - Perguntas e respostaso que é que para mim representa a ZoNA?

sinopse 2
“ZONA” “…apresenta-se como sendo um local com respiração própria onde se podem realizar os nossos desejos mais secretos. Está em constante alteração, o que a torna irreconhecível. Mexe-se, alimenta-se e transforma-se. Possui caminhos que se abrem e desaparecem. Fenómenos inexplicáveis que podem ser fatais para quem nela se aventura. Chuvas de prata. Tudo é realidade…”.


sinopse 3
ZONA por João Garcia Miguel
A zona é um alvo feito de círculos concêntricos de várias cores que irradiam influências e que se elevam ou se afundam. É uma esfera eterna onde o plano é obeso. É um espaço vertical. É um território onde nos movemos e no qual não nos reconhecemos. A zona é uma ideia sobre a origem que é o local aonde as forças se escondem e repousam imediatamente antes de nascer. Uma espécie de útero ou círculo ou buraco, boca ou bolso. A zona é viscosa e chupa-se. Alguma coisa altera-se aqui, sentes? Eu não e tu? Olha se perceberes e eu não avisa-me. Na zona os bebés não nascem nas árvores. Há pão no jardim. Na zona a água está cheia de palavras. E a verdade é um poço cheio de ecos vagos. Um poço onde todos vão beber água. A zona é redonda porque tem todas as faces assim como o mundo. É onde se acorda sem se adormecer. É onde não existe ninguém mas a vida continua.

sinopse 4
ZONA por João Garcia Miguel
Um planeta um sol uma luaUm velho um extraterrestre e um assassinoUm cemitério e uma maternidade. Um útero e uma fossa. A cona da mãe.Um local onde as pessoas perdem a memória e por isso passam umas pelas outras sem se reconheceremUm festim de lobosUm festim de lobos num quarto de brinquedos giganteO jogo do quarto escuroUm cerco. Um local cercado de onde ninguém se consegue escaparO lugar da culpaO paraíso reconquistadoO penico de Deus ou de um gajo muito grande que vai para ali vomitar e cagarUm parque de diversõesOu de que é que eu quero falar quando falo na ZoNA?Da sensação de culpaDo futuro com e sem pontos de interrogaçãoDas formas da forçaE das forças da formaDa influência invisível que se nos incorporaDo desejo como absoluto desejo Da testemunha. E de uma estória de amor.A zona é a mãe de todos. A grande batalha. Sempre em busca dela. Da mãe. Ruínas. Mãe. Da velhice até ao nascer do Sol.

sinopse 5
ZONA por Mónica Samões
ZONA. Uma entidade clinicamente distinta. Começa por ser uma doença benigna de infância. Depois adormece nos nervos até ser novamente reactivada. O primeiro desejo é morrer de amor. Objectos em queda livre nos intervalos de respirações mais e mais compulsivas, sonhos mal concretizados, uma morte lenta à beira da água, seduções infantis, marcas em corpos que se confundem no tempo. Nesse tempo que aparece e desaparece. Alguém fala no medo do futuro. Pois que fujam, se encontrarem maneira. Aqui pode-se sempre pensar em formas delicadas de o fazer.O segundo desejo é a transformação: Achas que me podia transformar numa bárbara, daquelas verdadeiramente selvagens, sem pudor e sem vergonha? Uma verdadeira profissional, com direito a um super cavalo que contrariasse os sentidos mais básicos das coisas. Submeter-me a jogos de morte, roletas russas, ir até ao limite do inacabado e frequentar bombas de gasolina todas as noites.O terceiro desejo ninguém sabe qual é. Sentes-te ser guiado por um mundo deslocado, quase igual ao outro mas diferente. Começas a sentir uma pequena impressão que te arranha a espinha. À medida que os dias passam a impressão cresce, invade-te outras zonas do corpo e modifica-o. Pensas constantemente na imagem de alguém que respira como tu. O terceiro desejo é-te negado porque não paras de comer.

sinopse 6
ZONA por Eric da Costa
Encontrei mais Zona em Jorge Luis Borges do que em Tarkovsky. Não há ciência na Zona, nem raciocínio. Todos os que estão aqui a dormir estão acordados noutro lado, as palavras ressoadas no presente, ditas no futuro são ouvidas no passado; e todo esse amontoado de detritos deixado pela nossa percepção nada dizem do jogo. Qualquer frase é impossível de ser dita sem que produza de imediato uma epidemia de pensamentos sem verbo, ao que nos faz semelhantes a um punhado de areia no deserto.Cada ser é um órgão de si mesmo, uma entidade semelhante. E por sua vez cada entidade é órgão de uma só substância. Quando um deles sente, todos sentem, quando um deles pergunta a dúvida é de todos, quando um deles morre todos sobrevivem.A geometria da Zona é o plano e não o ponto, e cada indivíduo que a percorra modifica-lhe a forma ao passar. Esse indivíduo não conhece a ciência tal como a reconhecemos, antes, é incapaz de determinar duas vezes o mesmo resultado para um mais um, a menos que seja dotado de memória.Na Zona toda o obra é de um só autor, o plágio é um conceito inexistente, é o tempo ele próprio que se encarrega de assinar a sua existência. A fotografia de um lugar nunca representa o ícone presente no tempo em que se premiu o obturador, antes revela a matriz de todo o tempo em nenhum espaço.Quem escrever um livro na ¦Zona, verá as suas páginas fluir sem nunca reencontrar uma palavra sua. Na Zona todas as coisas perduram enquanto as pessoas se ligam a elas, quando as pessoas morrem ou se vão embora não é incomum que essas coisas deixem de existir também. A Zona não tem ordem nem caos, e a imagem que reflecte o som da luz não revela o seu protagonismo desejado, relegada para o bastidor dos nossos dejectos, brilha para si.Há um porto na Zona, onde nenhum barco acosta de tão altos que são os seus paredões, não é provido de cabeços nem amarras.As suas pedras protegem o mar de ser esquecido. Embriagar os ouvidos dos outros com as palavras e as melodias de um terceiro, é como servir numa bandeja cerveja em copo de pé alto acompanhada de palitos de la reine.

sinopse 7
ZONA por João Galante
Então estiveste na zona. Divertiste-te?Não.Aborreceste-te?Tão pouco.Que te aconteceu na zona?Fiz uma experiência.Que experiência?A experiência da zona.E em que consiste a experiência da zona?Consiste em fazer a experiência do que é a zona.E o que é a zona?Como hei-de dizer-te? A zona é a zona.Mas suponhamos que, realmente, eu não saiba o que é a zona. Explica-me tu o que é.Nem eu sei exactamente o que é. Sinto-a, eis tudo. Até tu a devias sentir.Que queres dizer?Quero dizer que devias sentir a zona como se sente, no escuro, alguém que não se vê, que nada diz, mas que, no entanto, está presente.Não te compreendo.Devias senti-la lá em baixo, no oriente, para além do mediterrâneo, da ásia menor, da arábia, da pérsia, do afeganistão, lá em baixo, entre o mar da arábia e o oceano índico, presente e à tua espera.Mas à minha espera para quê?Para nada.Mais uma vez não te compreendo.Ou melhor, absolutamente sem qualquer motivo.Está bem. Mas ainda não me disseste o que é a zona.A zona é a zona.Diz-me isso por meio de um conceito, de uma sentença, de um slogan.Pois bem, a zona é o contrário da europa.Continuo como dantes. Era preciso que, primeiro, me dissesses o que é a europa.Prefiro encontrar uma definição para a zona. Digamos, então, que a zona é o país da religião.E é por isso que é o contrário da europa? Mas a europa também é religiosa.Não, a europa não é religiosa.E, no entanto, tem o paganismo do mediterrâneo e dos países nórdicos, o catolicismo, a reforma…Não importa. A europa não é religiosa.Então o que é a europa?Se fosse um zoniano, talvez o soubesse dizer. Como europeu isso torna-se difícil.Então, imagina que és um zoniano.Bem, como zoniano dir-te-ei: a europa é aquele continente onde o homem está convencido de viver no centro do mundo, onde o passado se chama história e a acção é preferida à contemplação; a europa é onde se pensa, vulgarmente, que a vida vale a pena ser vivida, onde sujeito e objecto convivem em boa harmonia e duas ilusões como a ciência e a política são tomadas a sério, onde a realidade nada esconde, quando ela própria, afinal, nada é. Que tem a europa a ver com a religião? João Galante d´aprés Alberto Moravia

sinopse 8
ZONA por Ana Borralho
A alma da Zona. Sempre em busca dela.A Zona é um manicómio de caricaturas. Como a verdade, um poço, mas um poço sinistro cheio de ecos vagos, habitado por vidas ignóbeis, viscosidades sem vidas, lesmas sem ser, ranho de subjectividade.Eu parti? Eu não vos juraria que parti. Encontrei-me em outras partes. Não vos posso jurar que fui eu que a visitei talvez tenha sido ela a visitar-me. Dei comigo a mudar quanto ao nível da consciência, comecei por sentir uma sensação de total imersão, tive a impressão que o tempo passava mais lentamente, à medida que a minha consciência crescia para um ponto de vista mais elevado e poderoso.Deixei de compreender se o efeito das minhas intenções alterava o universo físico ou se era uma influência invisível que se me incorporava. Respondi que não sabia bem o que fazer mas que me apetecia qualquer coisa estranha. Qualquer coisa estranha que substitua o medo. Disse-lhe que sim , que se tivesse oportunidade de largar tudo e ir para a zona, despedia-me de todos. Inteligência a mais ou amor a menos? O céu era muito grande e adormecia facilmente nesta época do ano. Parei de respirar. Fui e voltei várias vezes, à procura de uma intimidade como resposta ao mundo, acreditei sempre no meu regresso, até que um dia tive muito sono e não me apeteceu voltar. Será mesmo que nunca desembarquei de mim?Estranho, estranho, tudo muito natural quando nada na cabeça parece real, não é óbvio o sentido das coisas e das palavras mas é preciso fazer de conta, simplesmente dá vontade de vomitar o hábito para bem longe dela. É preciso ter calma e ir deixando mensagens. Aguardo que por aqui aconteça por aqui a explosão. Ou um abraço tão forte que me sufoque, por aqui. Será que se fechar os olhos conseguirei voltar ao princípio?O que dorme está vivo mas eu não dormi, ou se sonhei estava bem acordada, relaxei o corpo sobre a terra e deixei de o sentir. Não sentia o meu corpo mas sentia pernas, braços, sexo, vontade de suspirar, medo de me assustar, ouvia e via com a cabeça. Pensava muitas vezes se não estaria a ser manipulada. Tanta energia misturada num só lugar, tanta atracção imprevisível.E a coisa desaparece repentinamente não se sabe porquê, por aqui. Mas recomeça novamente e repete-se por aqui a dentro até se confundir aqui. Adivinhando por aqui o que se vai seguir. A porta está entreaberta e pressinto que a coisa está do outro lado por aqui, a tactear à procura de um interruptor. – Aquele cai sempre no mesmo erro, o erro da campainha. Toca sempre onde está a luzinha. A luz que nos atrai. Está escuro, existem dois interruptores, queres luz mas a luz que nos cega é uma armadilha e tocas na campainha do vizinho.As palavras saem incompreensíveis. Mas saem na mesma. Pelo meio a confusão e os sentimentos misturados com aquela musica de fundo e uma bateria, que me acompanha sempre, para manter o ritmo.Não se via nada. Podia ser, ao mesmo tempo, um buraco e uma montanha. Lembrei-me de um gajo que uma vez me disse: - …a zona é sempre em nós! - Não achei graça nenhuma. – Podes dizer tudo outra vez? Sabem da existência uns dos outros? Nesta altura eu convivia mal com a solidão.Estive todo o dia sem o saber. Onde estou quando não estou em lugar algum nem minha imaginação? Podia ficar calada, hoje o dia todo.Somos muitos mas eu não estou ainda, não entrei. Só alguns é que podem entrar. Mas ainda ninguém entrou.E vejo-a pela janela. E eu sinto que gosto dela. Que gosto dela e da cadela. Estarei eu pronta a reconhecê-la constantemente? E se eu decidir ficar? Estarei pronta a ignorar todas as contradições do meu estômago? Será por uma questão religiosa? A bíblia diz-nos como ir para o céu mas não nos diz como vão os céus.Encontrei o meu ponto e esperei muito tempo, até que por fim chegou. Mandei-o brincar, passados poucos minutos voltou, sentou-se a meu lado e ficamos muito tempo, em silêncio, a olhar para o mar. É preciso ver que ele ainda é um miúdo. Entendemo-nos perfeitamente. È genial como tudo o que é infantil. E os outros que aparecem só para confundir um pouco mais a paisagem? Também eles estão com medo. Têm medo, as cabeças ….Como é devido. Olham para este abismo sem fundo e sabem que inevitavelmente vão ter de descê-lo. Mas como descer? O que é que está lá no fundo? E, sobretudo, como voltar a subir?Que tudo siga o seu caminho; vamos viver numa suave ondulação o melhor que pudermos. É verdade aquilo que ele disse: o acto mais heróico da humanidade é ter sobrevivido, e ter a intenção de continuar…Se estiver cansada talvez durma Um risco muito direitinho, vertical, mais escuro que o escuro.A luz que sai do corpo.A mãe está a morrer as pedras serão os seus filhos. Acendi um fósforo e vi-me do outro lado.Ponha aqui a sua mensagem.Um dia hás-de falar contigo. No final tudo melódico.

sinopse 9
ZONA por Rita Só
Esboços sinopse ZONA Rita Só não mexe no pé.Descascaram os cinco uma banana num acto de estranheza, comeram a banana até ao fim e esperaram, nada mudou. Tudo se manteve igual a si mesmo. Eles iguais a eles mesmos só que alerta. A sensação de lá estar é semelhante à sensação de aqui estar? A andar com ela agarrada ao corpo, a coisa agarrada ao corpo e nem sequer saber. Impregnada de zona e a andar. Aqui não escondemos nada, temos medo mas não escondemos nada. Alguma coisa altera-se, sentes? Eu não e tu? Olha se perceberes e eu não avisa-me.A repetir-se, a Zona, estranhamente desigual, a tirar-me calor, a propagar-se como uma doenga ou não, como um milagre ou não. Olhou para mim e agarrou-me como se já me conhecesse. Não a conheço, nunca a vi mais roxa. Coisas estranhas que acontecem: suicídios; alguém que está na varanda, a varanda cai e a pessoa morre; loucos a tocar sem instrumentos a dançar sem música; visões; objectos que se mexem sozinhos, que se desfazem quando lhes tocas e o meu corpo habitado por um anjo mascarado de demónio que não te obedece, que não me obedece._ Am I a butterfly dreaming that I am a man?_Não sabes que o efeito pode produzir em ti, pode estar agarrado à carne, podes esfregar-te até ficares sem pele?Felicidade para toda a gente? Gratuita? Toda a felicidade possível. Gratuito! A felicidade! Gratuita. Cuidado.É-se visitado por algo, aconteceu assim como um desmaio, uma quebra de tensão, estas tão branca que pareces morta. Lembras-te como é que nasceste? Não, deve ter acontecido em algum desmaio. Fechou-se em casa dois dias seguidos, não atendeu o telefone e fechou as persianas com medo mas à espera de ser visitada. Certificou-se. De certeza que eles passariam através das portas fechadas. Desde aí um tempo para cá, a coisa funcionava de maneira diferente, punha a mão na cabeça, localizava com a ponta dos dedos as memórias de que não gostava, tocava-lhes de novo e estas desfaziam-se em pó.

sinopse 10
ZONA por Filipa Francisco
O medo. Tenho medo de quê?. Deste espaço que me rodeia, dentro e fora, até da respiração. Há coisas estranhas a acontecerem. Coisas que saem de dentro, dentro de mim, de dentro das pernas, filhos, amo-os tanto que os como, chupo. A Zona é a mãe de todos. Serei eu a mãe ou filha da mãe ou produto da zona para procriar. Um desejo constante, por mim, porque não há mais ninguém à volta. Onde estão? Desejo e repudio esta zona que não conheço. Uma voz off que sou eu diz: O tempo parado…tenho medo desse sopro, porque não gosto dele, I’ll run to tie your shoe.As pedras são as minhas melhores amigas, amantes, filhas. Ás vezes assumo posições físicas que não controlo. Fico só numa perna como um pássaro-egipcío-eremita, uma posição que chamo de bird-nijinsky-Simão do deserto. O meu corpo como zona. Mexo a cabeça descompassadamente, abro os braços e fecho-os como num suspiro. Não, a maior parte das vezes abro as pernas, muito, tanto que caem coisas: pedras, agulhas, flores, chaves. Chaves? Mas de que portas? A zona tem portas? Eu quero sair, não quero entrar, não, entram por mim adentro e esquecem-se de coisas, essas coisas devem fazer-lhes falta! Às vezes as coisas que tiro de dentro alteram-se e começam a cair, de cima para baixo, chuvas de objectos. O meu corpo cheira a… é como se mil jardins se levantassem. Ás vezes queria que tudo parasse. Tirem isto de mim. A zona é uma coisa cheia de desejos. Quero agradar-lhe, não sei como. Queria um vestido dourado, comprido, assim ás vezes quando caíssem coisas ninguém notava. Ás vezes não resisto e como tudo, não, não engulo, só chupo. Há coisas a acontecerem fora de mim, mas eu só penso em mim…Não me consigo mexer, lembro-me de mim sempre a correr e agora parece que fui metida numa pintura, só olho e deixo que me olhem.As coisas decorrem assim, por contraste e contradição. Quando me mexo, na verdade não me mexo ou não me quero mexer, o que vem da barriga é esta desfocagem em relação ao exterior. Não saber por onde sair, nem por onde entrar, o que foi antes ou depois. Há sempre uma expectativa sobre o próximo encontro e quando acontece finjo que os conheço, irrito-me e rio como se soubesse o que estou a fazer. Descrevo estas coisas para me ajudarem porque quando acordei já aqui estava.Quando olhei para o lado já tudo tinha desaparecido, tinha a sensação que havia uma arma e alguém tentava insistentemente, irritantemente vestir um casaco. Disparei numa fúria e tentei ganhar o jogo do braço de ferro, mas perdi. No caminho deixei de ver as minhas pedras, encontrei-as mais tarde como mortas, estaria eu morta?Como aquele gajo que subiu ao Everest e ficou sem falanges ou então quando quis apreciar a sua conquista e não tinha suficiente oxigénio. Assim aparvalhado, cheguei, coloquei a bandeira, bati uma pívia. Não, não conseguia meter a mão dentro do fato. Se o tivesse feito estaria hoje sem caralho.Vale a pena morrer?.Afinal gosto desta sensação de pintura. Estou parada e repito outra vez, olho e deixo que me olhem. Contrariar todos os meus feixes nevrálgicos. Os meus nervos em pulgas, parem meus queridos filhos da puta!.

sinopse 11
ZONA por Dora Lourenço
Na Z o n a existe um fundo negro que se cola aos olhos, a partir do qual todos os objectos se tornam coisas diferentes de si próprias, sem nome, sem função, longe da percepção, muito perto da imagem desnudada de um não lugar. O que é bom ou belo pode tornar-se inesperadamente mau ou feio, não há chão, o chão muda constantemente, deixa de existir. Os meus olhos não são os meus olhos porque não existem olhos, existe uma outra coisa que vê sem de facto ver, é um olho-umbigo, um olho feito de pele translúcida, aprende-se a tactear com ele , um olho-pele. Depois disto percebemos que existem os sensores secretos para coisas com vida sem vida: coisas, muitas coisa, mas que nome têm? Não se pode chamar por elas, e mesmo se pudesse, elas não respondiam, pois não sabem da sua própria existência. Temos de as adivinhar, para sobreviver, às vezes não se pode respirar - a respiração tem sempre uma cor na Z o n a , uma cor que nos (a)trai, que tem a densidade de uma gravidade humana. Os objectos-coisas explodem em todas as direcções à mínima variação de temperatura e de humor. Não confiam e nós também não podemos confiar. São objectos com funções desconhecidas, nuvens de objectos que mudam as nossas memórias, sem deixar rasto.Olha para dentro da pele e espera.Agora já podes respirar.

“Lying is good, just as all that is false is stupid”.
Life is the fault of fate. The cause of insatisfaction is life and it is fadista’s fault. What can I do except sing fado? Everyone is in mourning. The fadista is possessed, a kind of shaman who transports the others to sentiment. You must be quiet first to hear afterwards. The voice is emotion on the edge of precipice. Again, shy words. The guitar is a hammer and the voice a cave, a captive animal, and it almost hurts to hear it breathe. At the end, the howl, the animal dead, blood gushing, the eye fixed on the infinite and still alone.
Without any clear initial intention, we began to develop a series of concepts centred around the idea of deterritorialization of the theatrical act. An abusive theatrical design as an instrument for arriving at a form, that questions and proposes the space and sound of the performance.

Colaboraram na realização deste trabalho
ALBERTO LOPES
ANA BORRALHO
DAVID PALMA
DORA LOURENÇO
ELSA LIMA
ERIC DA COSTA
FILIPA FRANCISCO
FILIPA HORA
FRANCISCO ROCHA
FREDERICO BRANCO GOMES
JOANA LOPES
JOÃO GALANTE
JOÃO GARCIA MIGUEL
JORGE BRAGADA
JOSÉ PELICANO E PELICANO
LÚCIA MARQUES
LUÍS FIRMO
MARIA JOÃO SIGALHO
MÓNICA SAMÕES
RITA SÓ
RUI VIANA
SOFIA FERNANDES

apoios: Ministério da Cultura; Câmara Municipal de Almada; Clube Português de Artes e Ideias; Sociedade de Decorações Henriques & Rodrigues; Icomatro; Movifil; Mecanarte; Wurt; Prindil; Mecânica Piedense; Bicc Cel-Cat; Quimar; Euromola; PFAFF; M. Rôlo Lda.; Marques & Frederico; Aldeco; Black & Decker; Santos, Irmão & Marques Lda; Henkel Ibérica, S.A.; Robbialac; B.EL.EF Confecções e Têxteis, Lda.